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29/07/2022     nenhum comentário

RETROCESSO: CÂMARA DE SP MARCA AUDIÊNCIA PARA DISCUTIR OSs NO ENSINO

Especialistas são contra pela inconstitucionalidade do projeto e pelas ameaças que ele representa para a Educação Pública

 

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A Comissão de Educação, Cultura e Esportes da Câmara Municipal de São Paulo marcou para 9 de agosto uma audiência pública semipresencial que vai discutir o projeto de lei 573/2021, que autoriza as organizações sociais a assumirem a gestão de escolas públicas municipais na cidade.

O projeto é considerado um retrocesso pelos especialistas e pelos trabalhadores da Educação. A autoria é dos vereadores Cris Monteiro (Novo) e Rubinho Nunes (União Brasil). A proposta quer implementar uma sistema de gestão compartilhada em escolas de ensino fundamental e médio da rede pública municipal de ensino em parceria com organizações da sociedade civil sem fins lucrativos.

A audiência será às 11h, no Salão Nobre da Câmara, no 8º andar. Haverá transmissão online e participação virtual dos munícipes que se cadastrarem previamente.

Vereadores da oposição consideram a proposta inconstitucional. Está no texto do projeto que “as organizações sociais terão liberdade para estruturar a matriz curricular, o projeto político pedagógico, as metodologias de ensino e organização escolar, assim como os materiais pedagógicos da escola assistida desde que aprovados previamente pela Secretaria Municipal da Educação”.

O projeto de lei também diz que as “organizações sociais também terão autonomia para montar e gerir o time de professores, diretores, vice-diretores e secretário escolar, conforme previsto na lei municipal”.

Para entrar em vigor, a proposta dos vereadores ainda precisa passar por comissões antes de ir a plenário.

O Sindicato dos Especialistas de Educação do Ensino Público Municipal de São Paulo rechaça a iniciativa por entender que na prática ele “tem como propósito privatizar o ensino público municipal, transferindo a administração das unidades educacionais de ensino fundamental e médio a organizações sociais”.

O vereador Celso Gianazzi (PSOL), vice-presidente da Comissão de Educação, disse ao G1 que já prepara um relatório contrário ao projeto, que ele considera inconstitucional e prejudicial ao sistema de ensino atual.

“A gestão democrática prevê que o projeto político pedagógico é construído pela comunidade escolar, pais, alunos, uma construção coletiva e o projeto prevê que não será mais dessa forma, prevê que ele será feito pela OS, abrindo espaço para que a escola sem partido voltar aqui e fazer a sua ideologia, a sua filosofia, afastando os princípios democráticos da educação pública na cidade de SP, por isso ele é muito grave”, disse na matéria.

Veja abaixo o artigo publicado na Folha de São Paulo, pelo pesquisador do Transformative Learning Technologies Lab da Universidade Columbia em Nova York, pesquisador do Centro de Economia e Política do Setor Público da FGV/SP e ex-secretário municipal de Educação de São Paulo, Alexandre Schneider.

POR QUE É UM ERRO AUTORIZAR ORGANIZAÇÕES SOCIAIS A GERIR ESCOLAS EM SÃO PAULO

A implantação deste modelo é desvantajosa do ponto de vista financeiro. Sua eventual adoção implicaria perda de receita ao município, uma vez que o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) não prevê repasse de recursos para escolas conveniadas de ensino fundamental.

O município perderia cerca de R$ 6 milhões anuais por cada escola com mil alunos que conveniasse, além de ter que buscar no seu orçamento o valor a ser repassado ao parceiro. Desta forma, uma escola conveniada custaria no mínimo o dobro de uma escola administrada pela Prefeitura.

Ao contrário do texto da justificativa do projeto, não há evidência científica que a qualidade das creches conveniadas com a Prefeitura de São Paulo seja melhor do que as administradas pelo setor público. Como o modelo de administração privada de escolas públicas de ensino fundamental e médio não foi adotado no Brasil —apenas por um brevíssimo período em uma única escola em Pernambuco— tampouco há evidências de seu sucesso em relação ao das escolas públicas tradicionais.

Há um indicador de resultado de aprendizagem que pode ser utilizado para comparar escolas públicas e privadas: o resultado dos seus estudantes na última avaliação do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA).

Segundo esta, o resultado dos estudantes de escolas privadas e daqueles matriculados nos institutos federais de educação é o mesmo, ou seja, um bom projeto educacional e o nível socioeconômico dos alunos parecem contar mais do que se o modelo de administração escolar é público ou privado. Esse fato, por sinal, é algo que a literatura especializada já consagrou.

No contexto internacional, contudo, há muitos estudos produzidos e publicados em revistas acadêmicas respeitadas. O economista Martin Carnoy (Stanford) e a pesquisadora Lara Simielli (D3e e Fundação Getúlio Vargas) realizaram uma ampla investigação em artigos acadêmicos sobre “vouchers” e “charter schools”. O primeiro modelo consiste no repasse de recursos às famílias para que escolham uma escola privada para matricular seus filhos. Já as “charter schools” são escolas privadas financiadas pelo setor público sob regras definidas em um contrato de gestão, que inspira o projeto de lei paulistano.

A revisão dos autores, que englobou mais de 150 estudos artigos acadêmicos sobre o assunto produzidos entre os anos de 2012 e 2021, apontou que o impacto das escolas “charter” é nulo ou muito baixo na aprendizagem dos estudantes quando os resultados são agregados pela rede de ensino. Ou seja, pode-se entender que a competição entre as escolas pode beneficiar alguns alunos de maneira individual, mas não trazem benefícios para a rede de ensino como um todo.

Mais do que isso, a adoção deste tipo de competição entre as escolas aumentou a segregação e estratificação do sistema educacional nos Estados Unidos e na Suécia, o que também ocorreu no Chile com os vouchers.

Não se trata de negar a importância do estabelecimento de parcerias e contratos com organizações do terceiro setor e mesmo com o setor privado. Estes setores contribuem e podem contribuir com a escola pública em várias frentes, mas a adoção destes mecanismos claramente não é uma delas.

Ao invés de adotar políticas que já se mostraram pouco eficientes mundo afora, o ideal seria que nos dedicássemos a ampliar a autonomia das escolas públicas, desenhar carreiras que valorizem o desenvolvimento profissional dos educadores, garantir que os profissionais da educação cumpram sua jornada em uma única escola com salários dignos e a ampliar do controle social sobre os sistemas educacionais. É assim nos melhores sistemas educacionais do mundo. Pode ser assim no Brasil.

Publicado originalmente na Folha de São Paulo  

 

 

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