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07/03/2016     1 comentário

“Privatização via OS na saúde gera mais custos e menos eficiência”

Em entrevista ao Ataque aos Cofres Públicos, o advogado, professor de Direito Administrativo e escritor, Tarso Violin, é enfático: o modelo de gestão por publicização é um instrumento criado para burlar a Constituição em favor de interesses privados.

tarsosite

Tarso Cabral Violin, advogado e autor do livro “Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise crítica”, conversou com o Ataque aos Cofres Públicos sobre os efeitos devastadores das Organizações Sociais (OSs).

Entre outros cargos, Violin é vice-coordenador do Núcleo de Pesquisa em Direito do Terceiro Setor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), além de doutorando em Políticas Públicas e mestre em Direito do Estado pela mesma instituição.

Nesta entrevista ele explica porque o modelo de gestão é um instrumento criado para burlar preceitos da Constituição Brasileira em favor de interesses privados.

 

Qual a sua visão sobre as OSs?

Violin – Primeiro é bom lembrar que a crítica às Organizações Sociais não é uma crítica à participação da sociedade civil organizada nas questões de interesse público. Pelo contrário. Quando criticamos as OSs é porque defendemos a democracia participativa, deliberativa. OSs significam privatização no sentido amplo. São inconstitucionais pois servem para a administração pública fugir do regime jurídico administrativo, não realizar mais concurso público, não realizar licitação e contratar terceiros para prestar um serviço, uma atividade-fim que cabe ao Estado. Tudo com a justificativa de que o modelo de gestão é mais eficiente, o que também é uma mentira.

Os defensores das OSs citam que elas não ferem a Constituição porque o Supremo teria negado uma Ação Direta de Inconstitucionalidade que as questionou nesse sentido. Por que elas ferem a nossa Carta Magna?

Violin – Essa questão não está pacificada. Elas ferem a Constituição em vários aspectos. A nossa Constituição é uma constituição social. Ela não prevê que o estado seja mínimo, que seja um estado apenas regulador. Ela prevê um estado que presta serviços públicos, que intervém na economia de forma direta, complementar e de forma indireta também. Ela prevê que é dever do estado a Educação, a Saúde. Diz que é obrigatório o concurso público para contratação de pessoal nos serviços públicos. Portanto, OSs sendo utilizadas para substituição de servidores na administração pública são inconstitucionais. Quem fizer uma análise mais aprofundada sobre a decisão do Supremo vai verificar que, na verdade, não se entrou tanto nesse debate. Em seu voto inicial, o relator Carlos Ayres Brito chegou a falar que privatização na Educação e na Saúde é inconstitucional. Veio depois o voto do ministro Luiz Fux, que é bastante neoliberal e que diz que o modelo é constitucional, desde que as OSs atendam princípios como da moralidade, publicidade, isonomia etc. Esse voto acabou sendo vencedor, com vários ministros decidindo o contrário. No meu entendimento, usar esse meio para burlar concurso público é, sim, inconstitucional. Ainda dá para questionar no Supremo o uso irregular da Lei das OSs.

Existem prefeituras que repassam todos os seus serviços de saúde para OSs. Isso não se chama privatização não clássica?

Violin – Maria Sílvia Zanella de Pietro, que é talvez a maior jurista entre as mulheres na área de Direito Administrativo, diz que existe privatização em sentido amplo e privatização em sentido estrito. A primeira é qualquer repasse de responsabilidade do estado para a iniciativa privada, seja com ou sem finalidade lucrativa. Por exemplo, concessão de serviços públicos, como estradas, transporte coletivo e parcerias com o terceiro setor. Privatização em sentido amplo também engloba as privatizações em sentido estrito, como a venda direta das estatais. O contrato de gestão com OSs é uma privatização em sentido amplo.

Para além das definições e conceitos, o senhor pode citar os efeitos práticos da entrada das OSs na administração?

Violin – O Tribunal de Contas de São Paulo fez um estudo e já disse que privatização via OS na saúde gera mais custos e menos eficiência, ou seja, o serviço fica pior. Os profissionais da saúde acabam ganhando menos, enquanto os dirigentes das OSs ganham mais. Temos visto na TV, inclusive no Fantástico, os problemas sérios em unidades geridas por OSs. Outro dia foi divulgado que um hospital público contratou terceiros para um mutirão de cirurgias de catarata e deixou mais de 20 pacientes cegos.

É mais complicado fiscalizar esse modelo de gestão?

Violin – O controle é outro problema grande. Aqui em Curitiba há o Instituto Curitiba de Informática, o ICI, que é uma OS. Ele assumiu toda a informática do município e também foi contratado sem licitação por vários órgãos de administração pública do Brasil. Esse ICI é totalmente opaco. Não conseguimos obter informação nenhuma do que eles fazem com o dinheiro público. Eles funcionam como intermediadores. A administração não quer fazer uma licitação para contratar uma empresa de informática e então contrata o ICI sem licitação, que por sua vez, contrata empresas privadas, dando altos lucros para elas. É uma quarteirização sem transparência. Uma caixa preta. Nem o prefeito sabe pra onde vai o dinheiro e quem é contratado para prestar o serviço para a própria prefeitura.

Semana passada noticiamos uma operação policial que prendeu cinco pessoas ligadas a OSs na região serrana do Rio. Elas eram favorecidas nos contratos em troca de propinas pagas com dinheiro público. É o segundo escândalo em menos de seis meses envolvendo terceirização da saúde no Rio. Isso é só o começo?

Violin – Pior é que a mídia – muitas vezes a Rede Globo – esconde quando esse problema da corrupção está atrelado às OSs. Normalmente, a mídia nem cita o nome da OS. Diz apenas que se trata de hospital público, alvo de corrupção. Elas se safam e quem acaba levando a culpa sozinho é o poder público.

Os Conselhos Municipais e estaduais estão preparados para fiscalizar?

Violin – A nova lei das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) prevê a obrigatoriedade de conselhos com participação popular para fiscalizar os repasses de dinheiro. Mas OSCs são diferentes das OSs. Na lei das OSs não existe essa obrigatoriedade. O professor Celso Bandeira de Melo, que é o maior jurista do Direito Administrativo do Brasil, diz que se o Estado não é tão competente para prestar o serviço, ele é muito pior para fiscalizar o serviço repassado. Problemas em hospitais com servidores concursados ocorrem. Porém, problemas bem mais sérios, como corrupção, existem bem mais quando há dinheiro repassado para entidades privadas.

As OSs estão classificadas como entidades sem fins lucrativos, mas na prática como funcionam?

Violin – São entidades privadas. Em princípio, o dinheiro que vai para elas não poderia ser distribuído entre os dirigentes. Não pode haver distribuição de lucro. Eles até podem receber remuneração, mas não lucro. No entanto, é fato que existem vários esquemas Essas altas remunerações de diretores e demais pessoas ligadas às OSs ocorrem de forma transversa, por meio de contrato para algum tipo de serviço. Fiscalizar essas minúcias é algo quase impossível. O próprio discurso dos neoliberais é de que basta o controle da atividade-fim e não do meio. Mas sem fiscalizar o meio a corrupção acaba aumentando. Só fiscalizar se o serviço foi bem feito não é suficiente para brecar a corrupção.

Em Goiás há o projeto de implantar OSs nas escolas. Como o senhor vê a privatização na educação?

Violin – É inconstitucional. Nada ligado à Educação pode ser repassado. O estado não pode deixar de fazer concurso público para que professores sejam fornecidos pela própria OS. As questões pedagógicas não podem ser definidas, decididas e geridas por OSs. O Supremo não decidiu nada sobre essa questão na Educação. Se questionar, eu entendo que eles podem voltar atrás. Aqui no Paraná, quando o governo do PSDB, que é bastante neoliberal e privatista, criou a lei estadual das OSs, foi feito todo um movimento de ocupação da Assembleia Legislativa. Felizmente os professores conseguiram a garantia de que a educação não entraria na legislação das OSs.

A entrevista foi publicada no Jornal Diário do Litoral, neste domingo (6/3):

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Comentários (1)

  1. Carlos Eduardo disse:

    Onde buscaria mais conhecimentos para auxiliar e orientar contribuintes e amigos?

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