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24/04/2015     2 comentários

Lei de Responsabilidade Fiscal: uma barreira à construção do SUS público, integral e de qualidade

Muitos gestores acabaram por naturalizar a vigência desse limite da LRF, voltando-se para a contração de OSSs. É preciso romper com esse movimento, diz o professor de Economia da Saúde da USP, Áquilas Mendes.

O Professor de Economia da Saúde da USP, Áquilas Mendes, não tem dúvidas. A Lei de Responsabilidade Fiscal, que engessa os gastos com pessoal, é um dos antídotos do mal que vem matando dia a dia o SUS integral, público e de qualidade.

Para fugir das sanções da LRF os governos preferem cortar programas essenciais, como a Estratégia de Saúde da Família (ESF), ou terceirizar unidades e serviços por meio das Organizações Sociais (OSs). Trata-se de um atalho perigoso, cujo final do percurso é nocivo para a saúde pública e para os cofres públicos. O correto é pegar o caminho mais longo, porém certeiro. Lutar pela aprovação de propostas de lei no Congresso, como que eximem a área da saúde da LRF, faz parte desta jornada. Assim como lutar pelo aumento dos investimentos no SUS e contra a privatização da saúde via OSs, Oscips e Fundações.

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Leia o artigo de Áquilas Mendes, escrito para a publicação virtual da Domingueira da Saúde e entenda por que o limite de Gasto com Pessoal na Saúde pela LRF é uma barreira à construção do SUS público, integral e de qualidade: 
Há 15 anos, desde que a Lei Complementar Nº 101/2000, denominada Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF), foi aprovada, as áreas sociais, em especial a saúde,
vêm sendo prejudicadas no tocante à execução das suas ações e serviços.

De acordo com o princípio maior da Lei, em que os entes públicos devem gastar bem
menos do que arrecadam, vários limites são determinados ao poder Executivo,
especificamente, às despesas de pessoal, que não podem ultrapassar 54% da
receita corrente líquida do município. Caso isto venha a ocorrer, as penalidades
são significativas, conforme indica a Lei 10.028/2000 que tipifica crime em
finanças públicas.

Tal exigência legal vem afetando o comprometimento da instância municipal com a execução das ações e serviços públicos de saúde, em geral, e com a Estratégia de Saúde da Família, em particular. Na realidade, o respeito a esse limite da LRF, por parte dos municípios, tem levado a que direcionem seus gastos para a despesa com serviços de terceiros – pessoa jurídica -, isto é, referente à contratação de Organizações Sociais da Saúde (OSSs) ou Organizações Civis de Interesse Público (Oscips). Trata-se de uma grave distorção na aplicação dos recursos do SUS, sendo usados prioritariamente para financiar essas entidades privadas, a fim de executarem as ações e serviços de
saúde que deveriam ser de responsabilidade dos municípios.

Sem dúvida, essas entidades privadas acabam por administrar parcela importante dos serviços da rede pública com a lógica mercantil. Para se ter uma ideia, entre 2000 a 2014, é significativo o aumento da despesa com serviços de terceiros com pessoa jurídica nos municípios, sendo que a participação média dessa despesa na despesa total com saúde na totalidade dos municípios correspondeu a um patamar elevado de 27,5% e nos municípios maiores (acima de 400.000 habitantes) disse respeito a 36,3%. Enquanto que a participação da despesa com pessoal na despesa total com saúde foi de 45,9% e 40,9%, respectivamente (dados do SIOPS).

De forma específica, em relação à Estratégia de Saúde da Família, os tribunais de
contas têm considerado a despesa com este programa como gasto com pessoal.
Para a contratação do pessoal da ESF, os municípios também contam com os
recursos transferidos pelo governo federal. Devido a isso, há quem entenda que as
despesas com esse ‘pessoal’, por serem pagas com recursos de transferência, não
devem ser incluídas no limite da LRF. O limite deveria ser respeitado somente no
caso de o pagamento da cobertura dos profissionais ser proveniente de seus
recursos próprios, sendo contabilizada, então, como despesa de pessoal
(MENDES; MOREIRA, 2001).

Outra posição considera essa formulação inadequada. Segundo seu entendimento, o problema estaria no fato de as transferências integrarem a receita corrente e o gasto delas derivado não compor a despesa com pessoal, o que resultaria na ampliação indevida do limite de gastos com pessoal definida pela LRF. Considerando o pessoal da ESF nos limites da LRF, o ajuste deveria ser feito em outras áreas da gestão pública (CARVALHO, 2014).

Em que pese essa questão estar sendo alvo de intensa polêmica entre os municípios e os tribunais de contas, há 15 anos, e não estando ainda resolvido, em várias municipalidades, o Executivo tem colocado resistências à continuidade da ESF, “pensando duas vezes antes de habilitar novas equipes” e/ou “cancelando o programa, mesmo que temporariamente” (ibid). Por essa razão é que o financiamento da ESF, e também de outros serviços de saúde, por meio dos recursos municipais, torna-se problemático e até instável.

Nos últimos anos, é possível verificar a tramitação de diversos projetos de lei no
Congresso Nacional que excluem esse limite para as despesas da saúde. A
proposta mais recente é a do Deputado Amaury Teixeira (PLP- N.º 25, DE 2011-
Amauri Teixeira – PT/BA) que “altera a LRF para excluir do limite de despesas de
pessoal os recursos destinados a ações e serviços públicos de saúde”. Segundo
este projeto, o Artigo 19, § 1º, que trata das despesas que não seriam computadas
para o limite de despesas de pessoal incorporaria a exclusão das ações e serviços
públicos de saúde (inciso VII), conforme indicado a seguir:

Art. 1º O art. 19, § 1º, da Lei Complementar Nº 101/2000, na
verificação do atendimento dos limites definidos neste artigo,
não serão computadas as despesas:
I – indenização demissão servidores/empregados;
II – incentivos à demissão voluntária;
III – derivadas aplicação do inciso II do § 6 o do art. 57 da CF;
IV – decorrentes decisão judicial e da competência de período
anterior ao da apuração a
que se refere o § 2 o do art. 18;
V – pessoal DF,Amapá e Roraima, custeadas c/recursos
transferidos pela União (incisos XIII e XIV da CF,21 e 31 da EC 19;
VI – inativos, ainda que por intermédio de fundo específico.
passando a vigorar acrescido do inciso VII:
VII – relativas a ações e serviços públicos de saúde, nos
termos CF 198,2º”

Até o momento, esse Projeto não teve sucesso na sua aprovação. Na realidade, havia sido arquivado em 31/01/2015 e logo em 06/02/2015 foi desarquivado, a pedido da Deputada Jandira Feghali (PCdoB/RJ). Parece que essa temática ainda não é priorizada pelos parlamentares e pelo próprio setor saúde, que não vem demonstrando mobilização contrária intensa frente a este descaso. Muitos gestores acabaram por naturalizar a vigência desse limite da LRF, voltando-se para a contração de OSSs. É preciso romper com esse movimento.

Entendemos ser urgente e fundamental que todos os defensores do SUS público,
integral e de qualidade reúnam forças para solicitar a aprovação da proposta que exclui o limite das despesas de pessoal da LRF para a saúde. Precisamos reafirmar a defesa pela alteração dessa lógica mercantil que vem penetrando no SUS e desqualificando-o.

Referências Bibliográficas:
CARVALHO, G. Força trabalho e LRF. Campinas: IDISA, 2014. Disponível em:
http://www.idisa.org.br/site/documento_10724_0__2014—35—707—
domingueira—forCa-trabalho-e-lrf—12-1-2014.html. Acesso: 22 jan. 2014.
(Domingueira, 707).
MENDES, A; MOREIRA, M. (Org.). Comentários à Lei de Responsabilidade na
Gestão Fiscal. São Paulo: Cepam, 2001

Comentários (2)

  1. Luis Fernando disse:

    Olá pessoal. A terceirização vai muito além da LRF, é muito mais grave do que isso. Vocês esttão esquecendo do aspecto principal com as terceirizações, o fator POLÍTICO. Geralmente essas ONGs, OSCIPS ou OSS, são ligadas aos partidos que estão no poder, geralmente são ligadas a algum vereador onde se contrata muita gente para ganho político. Contratações absolutamente aleatórias não se importando com a qualificação e especialização do profissional. Os próprios funcionários terceirizados confessam isso, pelo menos na cidade onde eu trabalho, é muito comum eles se referirem ao vereador “X” quando o assunto é reclamação. Vai muito além do lado financeiro. Gente que ficou desempregada após as eleições e que trabalho para vereadores do partido que governa uma cidade ou estado, acaba sendo contratado via OSCIPS. É lamentável e é a precarização total dos serviços.

    1. Ataque aos Cofres Públicos disse:

      Bom dia Luis. Você tem razão nas suas colocações. O apadrinhamento político é realmente mais um fator negativo a ser denunciado. Vamos atentar mais para isso, pois sabemos os malefícios que eles causam para a democracia e para a qualidade do atendimento. Obrigado pela participação.

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