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04/06/2019     nenhum comentário

Por improbidade, contratos bilionários da saúde de SP estão na mira da Receita

De acordo com levantamento minucioso, houve subcontratação de empresas dos próprios dirigentes, pagamento de serviços nunca realizados, ou em duplicidade

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Uma extensa reportagem publicada no Jornal O Estado de S. Paulo traz detalhes de uma devassa realizada nos contratos bilionários de terceirização na saúde pública, firmados entre Governo, Organizações Sociais e empresas subcontratadas por estas OSs.

Segundo devassa realizada pela Receita Federal, há elementos que apontam para práticas de improbidade. As empresas foram chamadas a dar explicações, mas até o momento não conseguiram desarmar os argumentos técnicos que sustentam que houve prejuízos significativos ao erário com a contratação, pelo poder público, de OSs que, por sua vez, promoveram quarteirizações com empresas a elas ligadas.

Além da Receita Federal, da CPI da Assembleia Legislativa que já havia trazido elementos semelhantes e de todos os alertas do Tribunal de Contas sobre as irregularidades no modelo de gestão, quem mais terá de gritar aos quatro ventos que terceirização é instrumento para corrupção e causa mortes?

Confira abaixo a matéria do Estadão, ou clique aqui para ir direto para o site do jornal e ler a íntegra, com os pronunciamentos de todos os envolvidos.

 

Receita vê improbidade em contratos bilionários da saúde pública de São Paulo

Devassa aponta subcontratação de empresas dos próprios dirigentes, pagamento de serviços nunca realizados, ou em duplicidade; Promotoria determinou que Organização Social de Saúde, secretarias de Estado e do município enviem explicações

Luiz Vassallo

Uma das maiores detentoras de contratos na Saúde do Estado de São Paulo está na mira do Ministério Público. Supostos uso de dinheiro público para subcontratar empresas dos próprios dirigentes, pagamento de serviços nunca executados, ou em duplicidade e outras irregularidades, foram levantados em uma devassa da Receita Federal.

A investigação corrobora com suspeitas levantadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito que mirou Organizações Sociais de Saúde (OSS) na Assembleia Legislativa de São Paulo. Os documentos foram obtidos pelo Estado. Nesta semana, a reportagem detalha a investigação de dois anos feita pela Receita sobre contratos bilionários na Saúde de São Paulo.

Serviço Social da Construção Civil (Seconci) é a entidade que está em segundo lugar no ranking das OSS que mais receberam repasses entre 2014 e 2018. Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde, foram R$ 3,5 bilhões em contratos. A entidade foi fundada em 1964 por um grupo de empresários para dar assistência a seus trabalhadores e famílias, e, além de hospitais públicos, também administra filantrópicos.

Na prática, por ser uma entidade de terceiro setor, a legislação permite que o Estado contrate as OSS sem licitação para a gestão de hospitais do Sistema Único de Saúde.

Somente o Seconci faz a gestão de pelo menos hospitais estatuais e municipais. Também é responsável por unidades de Assistência Médica Ambulatorial da Prefeitura da Capital.

A entidade é detentora de contratos essenciais para a logística do SUS em São Paulo, como a Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde, a Central de Armazenamento e Distribuição de Insumos de Saúde e o Serviço Estadual de Diagnóstico por Imagens II.

Esclarecimentos
A Secretaria Estadual de Saúde afirma prestar pela transparência e diz que ‘para toda e qualquer excepcionalidade constatada, ou apontada por órgãos de controle, são tomadas providências ou prestados os devidos esclarecimentos’.

“Por isso, os contratos de gestão estabelecem os indicadores e metas de atendimento pelas OSS, que podem contratar pessoas físicas ou jurídicas para o atendimento à população. Devem também prestar contas ao Estado em relação ao uso dos recursos públicos que recebem, o que tem sido feito regularmente”, diz a pasta.

Já a Saúde do Município, que mantém contratos com a entidade, e foi requisitada a esclarecimentos pelo Ministério Público, diz que ‘os apontamentos, primordialmente, não compreendem unidades desta municipalidade e a administração busca informações mais detalhadas’.

“A Controladoria Geral do Município de São Paulo está apurando o caso por meio da Corregedoria Geral do Município e da Coordenadoria de Auditoria Geral”, afirma.

Já o Seconci afirma que ‘já apresentou defesa administrativa onde pode esclarecer todos os pontos e acredita que as posições da fiscalização serão revistas por instâncias superiores, dadas as robustas provas documentais apresentadas na defesa’.

“Com relação aos desdobramentos naturais do Auto de Infração, como seu envio ao Ministério Público Estadual – todos os questionamentos feitos pela Promotoria já foram adequadamente esclarecidos, devendo destacar que a fase é de apuração em esfera civil administrativa, não havendo qualquer acusação feita contra a entidade e seus representantes”, afirma.

Investigação

Os documentos da Receita mostram que o Fisco já estava de olho na entidade, pelo menos, desde 2016.

Durante dois anos, auditores fizeram 13 pedidos de documentos ao Seconci. Realizaram também 12 diligências em empresas contratadas pela entidade, no âmbito de convênios com o Poder Público. Parte delas, ligada aos próprios dirigentes da OSS.

Após os trabalhos, foi identificada uma série de irregularidades. A Delegacia Especial da Receita Federal, em São Paulo, encaminhou ao Ministério Público uma representação de improbidade administrativa.

No relatório, o Fisco informou ter encontrado diversas irregularidades. Ao instaurar investigação, a Promotoria enumerou práticas do Seconci, no âmbito da gestão de contratos com o Estado e o Município de São Paulo.

  •  Renovações automáticas dos contratos, sem análise da compatibilidade de preços com o mercado.
  •  Ausência de comprovação dos serviços prestados (especialmente atividade de consultoria e gerenciamento, tais como relatórios de gerenciamento, relatórios técnicos, correspondências, ou documentos produzidos no exercício da atividade), limitadas a atestados de dirigentes que não estariam presentes durante a respectiva execução.
  • Indícios de que o serviço prestado não foi realizado.
  • Cobrança em duplicidade (duas empresas diversas prestando o mesmo serviço).
  • Quarteirização de diversos serviços.
  • Clausulas prejudiciais ao interesse público, estabelecendo benefício injustificado em favor da empresa privada (13º parcela, multa rescisória em contrato por tempo indeterminado).
  • Quarteirização de atividade de gerenciamento de unidades (por vezes em caráter personalíssimo).

A investigação resultou em uma representação contra a entidade, protocolada pela Receita, por supostos atos de improbidade administrativa.

O caso foi enviado ao Ministério Público Estadual. O inquérito foi distribuído à promotora de Justiça Karyna Mori, que pediu esclarecimentos ao Estado, à Prefeitura de São Paulo, ao TCE, ao TCM, e ao Seconci.

Karyna deu 30 dias corridos para que as pastas estadual e municipal da Saúde, a entidade e as Cortes de Contas apresentassem informações sobre as suspeitas levantadas pela Receita.

A cúpula
A promotora verificou que os salários de dirigentes chegam a ser superiores ao do governador, e que parte deles abriu empresas que foram contratadas pela própria entidade.

Também foram subcontratados parentes dos executivos, segundo o Ministério Público. Alguns serviços teriam sido pagos em duplicidade, outros podem nem ter sido realizados, suspeita a promotora.

Em um caso, a entidade alugou insumos de uma empresa que não funcionava há anos. De acordo com a Receita, os equipamentos foram sublocados de outra empresa, por um valor bem inferior. A mesma empresa aparece no relatório da Receita em outras irregularidades.
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Em outro contrato, a promotora apontou que houve ‘aparente pagamento de serviços não prestados, e, na data da rescisão foi pago, a título de multa, o valor de dez honorários, acrescidos de um honorário mensal por cada ano de vigência de contrato’. Mori diz que a ‘cláusula é injustificável em contrato semelhante’.

Um dos dirigentes foi subcontratado para ‘prestação dos serviços relacionados em contrato tais como: administração hospitalar, consultoria e assessoria em gestão de saúde, elaboração e execução do planejamento orçamentário’.

Não havia nenhum documento comprobatório da efetiva prestação de serviço”, anota a Promotora, em análise ao relatório da Receita.

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Em contrato semelhante, outro executivo também foi subcontratado. Segundo a promotora, com base no relatório do fisco, os serviços específicos aos quais ele se propôs, por meio de sua empresa, a fazer, foram, na realidade, executados por outro engenheiro.

A investigação também aponta que, nas unidades geridas pelo Seconci, há médicos ausentes no plantão com ponto assinado, bem como em quantidade insuficiente. E ainda contradições das informações prestadas quanto ao plano de cargos, salários e benefícios.

A CPI

A entidade foi uma das escrutinadas pela CPI das OSS, na Assembleia de São Paulo. O relatório final da Comissão foi aprovado em setembro de 2018, com pedido de investigação sobre supostas irregularidades.

A CPI foi presidida pelo deputado estadual Edmir Chedid (DEM). “Embora mantidas com dinheiro público, muitas dessas entidades não se sentem obrigadas a prestar contas dos seus atos”, afirma o parlamentar.

Já em 2018, a Comissão chegou a receber um ofício do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, que já apontava 23 irregularidades na execução de convênios do Estado e de municípios de São Paulo com entidades sem fins lucrativos habilitadas a administrar hospitais públicos. Os apontamentos se referem apenas a contratos no interior.

Os trabalhos da CPI chegaram a identificar 22 médicos do Estado que também são donos de empresas que prestam serviços para entidades responsáveis pela gestão de hospitais públicos de São Paulo em contratos milionários.

Para Chedid, ‘as evidências contidas no relatório da Receita Federal reforçam algumas questões graves reveladas no ano passado pela CPI’.

“Por tudo isso, apresentamos à Assembleia Legislativa, ao final dos trabalhos da CPI, um projeto de nova Lei das OSs, ampliando o controle social sobre essas entidades e tornando mais rigorosos os critérios para contratos com o poder público”, afirma.

Relatório final

O relatório, inicialmente apresentado pelo deputado Cássino Navarro (PSDB), recomendou à Mesa Diretora da Assembleia Legislativa de São Paulo representação contra o governador Márcio França (PSB) por crime de responsabilidade e ao Ministério Público Estadual por improbidade administrativa em razão da nomeação do secretário adjunto de Saúde, Antonio Rugolo Júnior.

Segundo o deputado, apesar de nomeado à pasta, Rugolo não se desligou da Fundação para o Desenvolvimento Médico e Hospitalar – FAMESP, que recebeu R$ 3 bilhões nos últimos cinco anos em convênios com o Estado.

No entanto, a recomendação foi retirada do documento final, e substituída apenas pela sugestão de demissão de Rugolo.

Além da recomendação, os deputados elaboraram alterações para a futura aprovação de uma nova legislação em torno das Organizações Sociais de Saúde.

OSS em São Paulo

Segundo dados do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, somente o Estado gastou R$ 28 bilhões com OSS por meio de convênios. As Prefeituras repassaram R$ 6,6 bilhões. Os números são do período de 2013 a 2018.

O relatório dá conta de que, entre os serviços de saúde gerenciados por OSS em São Paulo estão hospitais, ambulatórios, centros de referência para idosos, centros de reabilitação, serviços de diagnóstico por imagem, centros de armazenamento e distribuição de insumos de saúde e regulação de ofertas de serviços de Saúde.

As entidades são contratadas por meio de convênios e, para fazer contratações com o dinheiro público a elas repassado, não precisam abrir licitações. No lugar da concorrência, as entidades são permitidas por lei a fazer tomada de preços, que consiste em um levantamento de orçamentos para a escolha de prestadores de serviços terceirizados.

OSS na mira da PF

A corrupção em contratos do Poder Público com entidades sem fins lucrativos é investigada em diversos estados e municípios em todo o País. No Amazonas, o ex-governador José Melo chegou a ser preso, alvo da Operação Maus Caminhos, que mira contratos do Estado com o Instituto Novos Caminhos para a gestão de hospitais.

Em São Paulo, mais recentemente, a Operação Ouro Verde mirou fraudes em contratos da ONG Vitale. O Prefeito de Campinas, Jonas Donizete, é investigado. A PF chegou a apreender R$ 1,2 milhão na casa de um servidor público da cidade.

Segundo o TCE, a Vitale recebeu R$ 14 milhões de verbas do Estado. A Prefeitura de Campinas, no Centro da Ouro Verde, gastou R$ 1,1 bilhão com OSS.

Todos negam irregularidades.

 

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