denuncie Denuncie! denuncie
O.S. em Santos NÃO!
Facebook
Youtube
21/08/2017     nenhum comentário

O Programa Escola Total, a terceirização e os riscos às crianças

Acusado de pedofilia trabalhava com milhares de crianças em projeto de ensino em tempo integral da Prefeitura de Santos na educação

pedofilo-no-escola-total

Não é segredo que a terceirização em Santos não existe apenas na saúde e na cultura. Ela penetrou na área da educação há mais de dez anos, desde o início do projeto de ensino em tempo integral, implantado pelo ex-prefeito João Paulo Tavares Papa (PSDB).

Batizado de Escola Total, o programa conta com pessoas contratadas, teoricamente como voluntárias. Na prática, elas integram uma força de trabalho terceirizada. Os vínculos trabalhistas não existem oficialmente. As relações são com os funcionários são precarizadas. Os salários são rebaixados, os benefícios são menores e frequentemente atrasam. E na hora da contratação não são feitas as mesmas exigências de formação que qualquer professor precisa ter para lidar com crianças.

Sempre denunciamos os danos causados pela forma de implantação capenga e populista do programa de educação em tempo integral causavam e causam na qualidade da educação de Santos, por razões óbvias. No entanto, nos últimos dias, uma notícia veiculada sem muito alarde na mídia local, mostrou que há razões de sobra para ter outro tipo de preocupação com esse tipo de terceirização escamoteada. Preocupações que extrapolam as questões pedagógicas e trabalhistas e entram no terreno da segurança e da integridade física dos menores atendidos.

A notícia versa sobre um caso de pedofilia dentro do Cais Professor Milton Teixeira. A unidade, que fica ao lado da Arena Santos, pertence ao Programa Escola Total em Santos e contava até pouco tempo atrás com os préstimos do educador-auxiliar voluntário Leonardo Ribeiro Fernandes, de 33 anos, preso no último dia 17, acusado de tentar abusar sexualmente de um aluno.

“Educador-auxiliar voluntário” é o nome do cargo dado aos profissionais que ministram atividades pedagógicas e lúdicas todos os dias, no contra-turno escolar, para milhares de alunos da rede municipal de Santos. De novo, frisamos: força de trabalho terceirizada e precarizada.

Conforme apurou o blog “Santos em Off”, em um texto que foi além da abordagem meramente policialesca, o suspeito atuava com crianças desde fevereiro deste ano, após ter se habilitado em processo seletivo da Secretaria de Educação (Seduc). No entanto, em um documento da Seduc de oito anos atrás, (Comunicado 88/2009), publicado em 21 de fevereiro de 2009, no D.O. (pág. 20), Leonardo já estava sendo chamado para entrevista a fim de integrar os quadros como “Monitor Assistente de Organização de Núcleo”.

Segundo a Prefeitura, não havia qualquer ocorrência suspeita que desabonasse a sua atuação.

A verdade é que se dependesse da Seduc, a situação nunca seria descoberta. Para que o suspeito fosse denunciado e preso, foi necessário que um pai de um adolescente de 13 anos descobrisse um encontro marcado pelo “educador-auxiliar voluntário” com o filho. O pai então acionou a Polícia, que prendeu Leonardo em flagrante, na Ponta da Praia, onde aguardava o adolescente.

O suspeito não resistiu à prisão e admitiu a intenção sexual. O “monitor voluntário” ainda confessou aos investigadores que mantinha frequentemente conversas com menores de idade, e que no computador dele havia vídeos e fotos com crianças e adolescentes praticando sexo.

No celular do contratado pela Prefeitura, a polícia ainda encontrou conversas em aplicativos de mensagens nas quais aparecem crianças e adolescentes sem roupa. Os investigadores também constataram a existência de conversas que ele mantinha com outros menores, ainda não identificados.

“O que causa estranheza é que a Prefeitura de Santos, simplesmente, comprou a versão da imprensa e não se deu ao trabalho de informar publicamente que o acusado convivia diariamente mais 12 mil crianças por mês e que possam existir outros casos semelhantes ao que acarretou a prisão do monitor. Como estarão os pais das crianças que frequentam o Cais Milton Teixeira?”, pergunta o blog Santos em Off, em artigo publicado dois dias após a prisão.

Para a mesma página, a Secretaria de Educação informou que Leonardo Fernandes seria afastado imediatamente da função que exerce como forma preventiva, a fim de proteger e preservar os alunos.

Somente após a matéria do dia 19, é que alguns veículos de imprensa destacaram o fato de Leonardo atuar com as crianças da rede municipal.

Esse não seria o primeiro caso parecido envolvendo profissionais contratados de forma temporária. Há relatos de situações de libidinagem cometidos contra alunos, só que por funcionários terceirizados do setor de limpeza. Geralmente os episódios são abafados pela Prefeitura.

Escola Total, um laboratório da terceirização na educação

Sabemos que a escola de período integral é uma necessidade e uma reivindicação histórica da classe trabalhadora. O problema é a maneira como os programas são implantados. A maioria dos governos tratam essa política importante apenas como meras ampliações de carga horária, com baixíssima qualidade, contratando para atender as crianças trabalhadores sem vínculo empregatício, como os tais “monitores voluntários”, ou com condições rebaixadas, como os contratados por Organizações da Sociedade Civil (OSCs).

Assim é o Programa Escola Total de Santos. Por essa lógica, não se garante de fato a qualificação do processo de ensino-aprendizagem. As unidades com contraturno servem apenas para justificar que algo está sendo feito para “tirar as crianças das ruas”. Muitas vezes, esse tipo de iniciativa propicia a formação de enormes currais eleitorais.

Não negamos que existe um esforço por parte da maioria dos trabalhadores contratados para tentar dar conta do recado. Sabemos que por necessidade eles se sujeitam a muita exploração, atrasos nos pagamentos e péssimas condições de trabalho. Mas também não podemos negar que, aplicado desta maneira, o programa de ensino em tempo integral se configura como uma farsa. Pior, cria as condições favoráveis para justificar a entrada de Organizações Sociais, reforçando ainda mais uma lógica gerencial e privatista da educação, e aprofundando um ensino “dualista”, onde o aluno de uma mesma escola recebe qualidades distintas de atendimento em cada um de seus turnos.

Somente o profissional de carreira, por ser preposto do Estado (os governos passam e ele permanece), pode exercer e desenvolver a democracia na escola, contribuindo para o aumento contínuo da qualidade. Todos os demais funcionários, (celetistas da Lei 650, funcionários de Organizações Sociais, funcionários das OSCs, monitores contratados como voluntários, frentes de trabalho, agentes comunitários, “chequinhos” e “cachês”), são prepostos do governo. Isso é muito ruim, pois significa que estão condicionados por seu frágil vínculo empregatício, aos ditames dos prefeitos e vereadores de plantão.

Estes últimos se utilizam deste poder para incidir autoritariamente sobre estes trabalhadores, a fim de obterem votos e posicionamentos políticos alinhados dentro das escolas, em troca da manutenção de seus empregos.

Está mais do que na hora dos profissionais da Educação e todos os membros das comunidades escolares de Santos exigirem a completa reestruturação do programa de escolarização de tempo integral, com a inserção imediata de servidores de carreira para desenvolvê-lo.

Somente desta forma será possível transformar a escola de período integral em uma escola verdadeiramente democrática, de qualidade e segura para as crianças.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *