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11/03/2019     nenhum comentário

Mais uma morte com suspeita de negligência na UPA Central de Santos

“Aquele lugar é um matadouro”, diz irmã de paciente atendida na unidade terceirizada pela FUABC

 

carmen-upa-central-site

Mais uma família dilacerada pelo luto denuncia a morte de uma paciente na UPA Central de Santos. Os familiares da balconista Carmen Lucia Ferreira Vicente, de 49 anos, procuraram o Ataque aos Cofres Públicos para dar os detalhes do que consideram um atendimento falho, que acabou agravando o caso e evoluindo para o óbito.

A paciente, moradora do Morto São Bento, foi vítima de um AVC.

Antes de detalhar os fatos, lembramos que a UPA Central é gerida pela organização social Fundação do ABC. A despeito dos muitos problemas e irregularidades que pesam no histórico da instituição privada, o prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB) segue aprovando o trabalho da OS e apostando na terceirização do serviço, ao custo de cerca de R$ 21 milhões ao ano.

Neste sábado (9), a imprensa noticiou que as equipes contratadas pela Fundação erraram no diagnóstico de um adolescente (saiba mais aqui). João Vitor de Alcântara, de 14 anos, estava com meningite e demandava internação e tratamento específico imediato, mas foi diagnosticado com sinusite e liberado duas vezes pelos médicos plantonistas que o examinaram. A família levou o garoto para um hospital em São Paulo e somente lá ele foi corretamente diagnosticado e internado para tratamento adequado.

Com Carmen o fim da história foi mais trágico. A balconista e sua família passaram por um verdadeiro calvário no mês passado para tentar garantir um tratamento a contento.

Os relatos indicam demora para o encaminhamento a uma tomografia, necessária para confirmar a suspeita de AVC e para classificar a gravidade do caso. Consequentemente, houve demora para a inclusão da paciente na lista de solicitação de vaga UTI.

Apesar dos apelos da família para uma maior agilidade nos trâmites, o quadro se agravou dia a dia. Carmen faleceu no dia 12 de fevereiro, três dias depois de finalmente ser levada para um leito de UTI no Hospital de Pequeno Porte (HPP). Mas ela já teria chegado no local, anexo à Santa Casa, onde funcionava o antigo PS Central, em estado gravíssimo.

Uma das irmãs de Carmen, a atendente de educação Débora Vicente de Souza, usou o termo “matadouro” para classificar a UPA gerida pela OS.

“Tive que implorar a uma médica para ver se tinham colocado mesmo minha irmã na lista para ser levada ao exame de tomografia. Ameacei não sair do local enquanto não me mostrassem a lista com o nome dela para ser submetida à tomografia. Só com essa insistência ela fez alguns telefonemas e inseriu”.

O calvário

Segundo a educadora, a irmã foi levada de ambulância para a UPA no início da tarde do dia 7 de fevereiro. A paciente ficou na sala de emergência e não foi permitida a entrada da família. Quando o filho da paciente conseguiu entrar, por volta 1 hora do dia 8, encontrou a mãe toda urinada e sem qualquer medicamento ou soro. “Simplesmente nada tinha sido feito”, disse.

Às 16h do mesmo dia, Débora chegou à UPA para tentar ver a irmã, mas só foi autorizada a entrar por volta das 17h30. “Encontrei ela no leito, sem medicação e sem alimentação. Ainda não havia sido feita a tomografia, a médica de plantão só falava que ela teve um AVC isquêmico e que estava aguardando vaga”.

Só após muita insistência da família, Carmen foi encaixada para a tomografia, mas foram informados que este tipo de exame só pode ser realizado à noite.

“Perguntei porque, então, não foi feito na noite anterior, já que a paciente chegou às 15h, com quadro característico de AVC. A médica simplesmente não me respondeu”.

Por volta das 21h do dia 8, Carmen foi levada para fazer a tomografia. Nenhum parente pode acompanhar o exame. “Eles alegaram que um médico responsável é que faz esse acompanhamento. No entanto, depois soubemos que quem acompanhou foi um residente”.

O fato é que na Santa Casa, onde foi realizada a tomografia, o AVC foi confirmado e o caso foi classificado como gravíssimo. “Se era grave a esse ponto, porque minha irmã já não ficou lá no hospital, numa UTI? Por que levaram ela de volta para a UPA, que não tem condições nenhuma de cuidar de casos complexos? Após o retorno ela ficou do mesmo jeito que estava antes”.

Indignada, Débora conta que a família saiu da UPA Central por volta das 3h da manhã do dia 9 (sábado). Naquele momento a paciente estava apenas com uma espécie de sugador de saliva na boca.

“Retornamos às 6h da manhã do sábado e fui perguntar notícias. Um enfermeiro informou que a minha irmã estava num aparelho, pois o médico de plantão achou necessário para ajudar na respiração. Disse novamente que o caso era gravíssimo, mas nada de vaga para tratar o AVC”.

Depois das 8h da manhã, os parentes não conseguiram saber mais nada. Às 16h, quando entraram para visita, constataram que Carmen continuava na mesma situação.

“Não sabemos se ocorreu alguma coisa na madrugada para minha irmã ir para o aparelho. Se foi para ajudar a paciente, por que isso não foi feito já no primeiro dia? Em todo tempo tentamos ajudar a conseguir uma vaga de UTI em qualquer hospital. Também perguntávamos sobre a vaga do CROSS e o motivo de minha irmã não estar neste sistema. Em nenhum momento mostraram a lista de espera por transferências”.

Débora ainda relata que após pedirem ajuda a conhecidos, conseguiram uma vaga no HPP por volta das 20h30 daquele sábado (9). A transferência ocorreu uma hora depois.

“Acompanhei minha irmã na ambulância. Era nítido que estava em estado pior de saúde. Ao entrar na UTI e ter os primeiros atendimentos, o médico responsável pelo plantão do HPP me informou que o caso era gravíssimo e que as pupilas já não estavam reagindo aos testes. Foi muito solicito e explicou tudo com muita atenção. Saímos do HPP tentando ter fé, mas com a certeza de que aquele cuidado deveria ter ocorrido já no dia 7, quando ela deu entrada na UPA”.

O óbito ocorreu no dia 12 e a família não para de se perguntar: se o caso era gravíssimo, por que não foi feita a tomografia no dia 7 e, na sequência, a solicitação de transferência para um tratamento intensivo?

“Se na UPA não há pessoas preparadas e equipamentos adequados e específicos para atendimento a pacientes com AVC, porque ficam lá sem qualquer cuidado?”, questiona a educadora.

Outras mortes

O caso de Carmen é apenas mais um entre dezenas que mostramos com denúncias de negligência e erro. Ele ocorreu no mês em que a UPA entra em seu quarto ano de funcionamento com o modelo de gestão por OSs, chamado de publicização. No fundo, nada mais do que uma terceirização capenga, marcada por baixa resolutividade no atendimento, zero transparência e nenhuma fiscalização.

Nos últimos meses outras mortes igualmente marcadas por fortes indícios de negligência foram divulgadas. Uma delas a do menino Luca, morto após esperar horas com fortes dores abdominais e em condições precárias por um exame de ultrassom (relembre aqui). A família acredita que se o exame de imagem tivesse sido feito, o problema poderia ter sido diagnosticado a tempo de serem tomadas as providências necessárias para evitar o óbito.

Na semana passada, tivemos outra morte envolta em suspeita de negligência. A vítima foi uma idosa que esperou demais quando deveria ter sido atendida de imediato devido às dores no peito e pressão alta. O caso foi na recém-inaugurada UPA da Zona Noroeste, que também é gerida por uma OS ficha suja (SPDM), com diversas denúncias por negligência, erros e problemas na prestação de contas. (Veja aqui)

Os vereadores de Santos e o Conselho Municipal de Saúde, que permitiram a aprovação da Lei das Organizações Sociais (OSs), têm participação nesse quadro terrível que virou o pronto atendimento na rede municipal.

Eles garantiram que não haveria problema algum na contratação de empresas pela Prefeitura. Os fatos mostram dia após dia que a ótica do lucro das UPAs, aliada a displicência dos gestores, tem ceifado vidas. Agora os envolvidos fingem que não têm nada a ver com os dramas!

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