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18/06/2018     nenhum comentário

Denúncias mostram ‘cabides de empregos’ entre terceirizadas e prefeituras do RS

Empresas contratadas empregariam pessoas indicadas por políticos e aliados nas cidades de Canoas, Triunfo e Guaíba.

esquema-terceirizadas

Matérias em rede nacional, incluindo reportagem especial no Programa Fantástico, da TV Globo, desmascararam um esquema de indicações políticas loteadas por políticos em empresas terceirizadas  e organizações sociais contratadas pelo poder público em pelo menos três cidades do Rio Grande do Sul.

O esquema está sendo investigado depois que ex-funcionários denunciaram que as empresas são utilizadas como cabides de empregos no toma lá dá cá da política. Fraudes em licitações e até pagamento de propinas são algumas das suspeitas levantadas. O Grupo de Apoio à Medicina Preventiva e à Saúde Pública (Gamp) é uma das OSs citadas.

Veja abaixo o vídeo com a reportagem no Fantástico:

Canoas e Triunfo são duas cidades abordadas pela RBS TV, exibida no Fantástico neste domingo (17).

Em Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, as denúncias partiram da ex-diretora de uma secretaria da administração municipal. Ela era responsável pelos contratos na área de assistência social.

A ex-diretora revelou que recebeu currículos de trabalhadores enviados por vereadores e assessores ligados ao prefeito Luiz Carlos Busato (PTB).

“Não existia processo seletivo nenhum”, afirma a mulher, que não quis se identificar.

A reportagem identificou apadrinhados de políticos em locais como escolas e até no Hospital de Pronto Socorro da cidade. Entre os indicados, também localizou uma ex-cadastradora do Bolsa Família.

A mulher diz que fazia parte de um grupo de 15 ex-funcionários, todos supostamente indicados às vagas por políticos. Segundo ela, eles teriam ingressado na justiça porque sequer receberam parte dos salários.

Ela disse que somente conseguiu o emprego porque fez campanha para um vereador e para o prefeito da cidade.

“Não quero mais ouvir de partido nenhum, não quero fazer mais parte de corja nenhuma. (…) vou continuar desempregada, fazendo um bico aqui, um bico ali”, desabafou.

Esquema revela que empresas terceirizadas contratadas por prefeituras se tornaram como cabides de emprego com aval de políticos.

Com uma câmera escondida, a reportagem conseguiu comprovar que a OS Gamp aceita indicações políticas em seu quadro de servidores. No ano passado, a organização social recebeu da prefeitura de Canoas R$ 190 milhões para administrar unidades de saúde e de assistência social do município.

Embora admita que por ser uma entidade classificada como sem fins lucrativos, o Gamp é obrigado a realizar um processo seletivo transparente, o diretor da empresa, Régis Marinho, afirmou que no recrutamento são criados critérios subjetivos para que esses apadrinhados possam ser acomodados.

“Eu tenho várias formas de criar critérios. Aí a gente bota: ‘o processo seletivo vai se dar de tal forma’, até pra poder garantir essas pessoas de confiança de vocês dentro do processo”, declarou o diretor.

Perguntado sobre se haveria alguma contrapartida, ou seja, pagamento de propina ao contratante, ele disse que esse assunto “teria que ser discutido com superiores”.

A postura do diretor, na opinião do Procurador Geral do Ministério Público de Contas (MPC) do estado, Geraldo da Camino, configura uma fraude, e fere os princípios da impessoalidade e da moralidade do serviço público.

“Evidentemente está sendo confessada uma fraude. E uma fraude deve ser coibida pelos meios legais”, declarou Da Camino. Ele vai pedir abertura de investigação ao Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Propina

A ex-diretora da prefeitura explicou como era feito o pagamento de propina a autoridades municipais. A fraude consistia em incluir servidores fantasmas na folha de pagamento das terceirizadas. Seriam pessoas de “confiança” dos gestores.

Depois que os salários eram depositados na data do pagamento, os laranjas faziam o saque e repassavam os valores aos políticos.

“(…) Eram contratados 10 (funcionários). Entende? O contrato era pago como 15 [funcionários], sobrava, digamos R$ 7 mil, esses R$ 7 mil ficava para eles [políticos]”, explicou.

Entre as terceirizadas que adotaram a prática em Canoas, conforme a a ex-diretora, estaria a Coopas, que tem sede em Porto Alegre. Sem saber que estava sendo gravada, a diretora da empresa admitiu que esse tipo de esquema existe e serve para garantir pagamento de suborno aos contratantes. Ela cita o exemplo de uma negociação realizada pela cooperativa.

Diretora: Eles (políticos) colocavam dois profissionais com o nome de coordenação, que não executavam o serviço, mas nós “pagava” eles e eles repassavam [o dinheiro aos políticos].

Repórter: E se tiver alguém pra denunciar?

Diretora: Aí nós “tamos ferrados”. Eu e tu. Hahaha.

Durante o período em que a reportagem apurava as denúncias, a ex-diretora disse ter recebido ameaças, via WhatsApp. Em uma das mensagens, uma pessoa não identificada escreveu que a denunciante estaria entrando em um mundo onde não teria “condições de sobreviver”.

“Eu tenho medo do meu filho, só isso. Eu não tenho vida, eu não tenho paz, eu não durmo, eu acordo rezando”, disse a mulher.

Na última quinta-feira (14), a delatora prestou depoimento ao Ministério Público, onde entregou uma cópia da mensagem, além de documentos e um vídeo.

A prefeitura de Canoas negou as acusações e disse que a ex-diretora chegou a ser responsabilizada em uma sindicância. Ela teria autorizado pagamentos por serviços não prestados por uma terceirizada. Ao depor nessa sindicância, a ex-servidora referiu a existência de apadrinhados políticos nas terceirizadas.

Ex-funcionária que denunciou esquema diz que foi ameaçada (Foto: Reprodução) Ex-funcionária que denunciou esquema diz que foi ameaçada (Foto: Reprodução)
Ex-funcionária que denunciou esquema diz que foi ameaçada (Foto: Reprodução)
‘Critério é político’, diz ex-secretário de Triunfo

Um ex-secretário da prefeitura da cidade de Triunfo, a cerca de 77 km de Porto Alegre, disse que as promessas de emprego a cabos eleitorais começam ainda na época da campanha, em troca do apoio na busca por votos.

“O critério não é profissional, é político. Fez campanha, trabalha, não fez campanha, está desempregado, como a maioria da população”, disse o ex-secretário. Ele pediu para não ter o nome informado.

Entre as terceirizadas que mantém contrato com a prefeitura de Triunfo está a Muhl, de Lajeado. Sem saber que estava sendo gravado, o proprietário, Valmor Muhl, admitiu que a empresa não realizou processo seletivo para contratar vigias responsáveis por realizar a guarda em prédios públicos da cidade e que “100% dos trabalhadores são apadrinhados do prefeito e vereadores”.

O contrato, segundo ele, rende à empresa R$ 500 mil por mês. Perguntado se houve pagamento de propina, afirmou:

“Não tem prefeitura que pra ti trabalhar, não tenha que dar uma mordidinha. Não existe”, disse o empresário.

A RBS TV teve acesso a uma cópia das escalas de trabalho dos vigias. Com os documentos em mãos, a equipe de reportagem esteve nos locais e constatou que a maioria sequer aparecia para trabalhar.

O prefeito de Triunfo negou recebimento de propina, o esquema das indicações políticas e a existência de funcionários fantasmas.

“Não tem isso, não. Nós não cobramos propina de ninguém. Isso é mentira”, afirmou Valdir Kuhn (PSB). “Nós averiguamos periodicamente a questão da frequência e da permanência do trabalhador no local de trabalho. Nós temos nossos fiscais”, completou.

Vereador afastado de Guaíba é mencionado

A reportagem exibida pelo Fantástico trouxe ainda novas revelações sobre a atuação do vereador afastado Renan Pereira (PTB), investigado pelo Ministério Público por se beneficiar de contratos firmados entre a prefeitura e empresas terceirizadas na área da saúde.

Além de fornecer mão-de-obra para essas empresas, ele também teria indicado trabalhadores para atuar em unidades de saúde da cidade, transferindo desses locais servidores concursados.

“Eles nos arrancaram do nosso local, do nosso horário, reduziram a nossa remuneração, para botar pessoas por indicação política”, protesta a técnica de enfermagem Babara Marcolin.

Por meio do seu advogado, o vereador disse que já se colocou à disposição das autoridades.

“Desde o primeiro dia de deflagração da Operação Interposto, o Dr. Renan dos Santos Pereira colocou-se formalmente à disposição e ainda aguarda o chamado das autoridades competentes de modo a prestar todos os esclarecimentos necessários. Entende que imputar à alguém o cometimento de crimes sem o contraditório pleno e antes de uma denúncia formalizada é preocupante e prematuro. Declara que estará buscando nos Tribunais o direito de retornar às suas atividades e à Presidência da Câmara de Vereadores”.

Outras investigações pelo Brasil

A reportagem da RBS TV também esteve em Campo Grande (MS) e Ribeirão Preto (SP), onde o Ministério Público responsabilizou ex-prefeitos, afastou vereadores e obteve bloqueio de bens de políticos para garantir o ressarcimento aos cofres públicos.

Na cidade do interior paulista, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) enquadrou por corrupção passiva os nove vereadores que indicavam funcionários para a Atmosphera, empresa que fornecia 700 funcionários para a prefeitura da cidade. Todos estão afastados dos cargos.

Ao aceitarem essas vantagens indevidas consistentes na contratação das pessoas que indicaram, os vereadores cometeram o crime de corrupção passiva, eles passaram atuar em seus mandados não mais representando os interesses legítimos de seus eleitores, e sim, defendendo o poder executivo municipal, e assim, mantendo esse esquema que lhes beneficiava, diz o promotor de justiça Valter Manoel Lopes.

Falta de transparência facilita esquema

Diferente do que acontece com os chamados Cargos Comissionados (CCs), órgãos públicos não são obrigados a publicar na internet as listas de trabalhadores de terceirizadas, com salários e local de lotação. Especialistas avaliam que essa falta de transparência facilita o esquema que transformou esse tipo empresa em cabides de empregos para políticos e abre caminho para fraudes e um serviço público desqualificado.

“É comum, nessas situações, que o trabalhador não tenha a qualificação necessária para atividades, muitas vezes, sequer cumpre a jornada e, o que é mais raro, tem até exemplos de devolução de parte do salário recebido”, adverte o professor de direito constitucional Aloísio Zimmer.

Já o procurador-geral do Ministério Público de Contas, Geraldo Da Camino, disse que o surgimento do esquema decorre exatamente do aperto da fiscalização em torno dos cargos comissionados. Assim, políticos recorrem às terceirizadas para acomodar seus apadrinhados e quitar dívidas de campanha.

A Constituição impôs o concurso público, aí passou-se a utilizar os CCs indiscriminadamente. Com o controle, exigindo a observância dos princípios constitucionais sobre os CCs, a saída agora é a contratação por terceirizações, em que continua existindo o compadrio e a retribuição através de cargos”, avalia Da Camino.

 

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