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02/12/2019     nenhum comentário

Comunidade terapêutica que atende dependentes químicos é alvo de denúncias em Santos

COMAD deu parecer contra a renovação do convênio após constatar irregularidades; Conselho de Saúde achou melhor dar prazo para entidade se adequar

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O modelo de comunidades terapêuticas, instituições privadas de tratamento a dependentes químicos, é alvo constante de críticas em diversas cidades do País.

Conveniadas a governos municipais e estaduais, elas recebem verba do SUS, a despeito das denúncias sobre o tratamento e as condições estruturais do atendimento.

Na região não é diferente. A Prefeitura de Santos mantém há mais de 14 anos um convênio com uma entidade responsável por esse tipo de espaço na cidade de Pedro de Toledo. A entidade, chamada Associação Projeto Respeitar – Comunidade Terapêutica São Francisco de Assis, disponibiliza até dez vagas para pacientes encaminhados pela Coordenadoria Municipal de Saúde Mental. Outras 15 vagas são reservadas para pacientes encaminhados pela Secretaria Estadual de Saúde.

De acordo com o Conselho Municipal de Políticas Sobre Drogas de Santos (COMAD), uma série de irregularidades encontradas em duas vistorias técnicas realizadas no local inviabilizam o serviço.

Os problemas foram apontados em dois relatórios. No último deles, feito após uma vistoria que contou também com a presença de membros da Comissão de Saúde Mental do Conselho Municipal de Saúde de Santos (CMSS), há denúncias de que os internos estão sendo usados como funcionários da casa, executando tarefas de limpeza e preparo das refeições.

Também há relatos de problemas estruturais, falta de profissionais e de irregularidades no que tange à segurança dos usuários (veja detalhes no quadro).

Na última reunião do CMSS, realizada no último dia 26, um dos conselheiros, que também faz parte do COMAD, Jorge Viana da Silva, chegou a utilizar a expressão “trabalho escravo” para definir o tratamento dispensado aos pacientes. “É inadmissível o que encontramos lá. Estado de abandono, penúria, uma precariedade vergonhosa. Usuários são submetidos a trabalho escravo e os alimentos estavam em péssima conservação”.

Tanto Jorge quanto a 1ª Secretária do COMAD, Wilmara Pereira Vasquez, pediram que o CMSS deliberasse pela não renovação do convênio. Esse item da pauta gerou muitas falas contrapostas. “Há um problema moral que o CMSS precisa analisar. A comunidade não conta com funcionários. Tudo é feito pelos usuários”, alertou.

No relatório consta a denúncia de que uma interna estaria realizando faxina na casa do presidente da Associação, o que o COMAD entende ser ilegal. Além disso, a situação contraria o que está expresso no Termo de Fomento. Na sua Cláusula Terceira consta que é obrigação da entidade “responsabilizar-se, integralmente, pela contratação e pagamento do pessoal necessário à execução do Plano de Trabalho e manter-se apta ao exercício das atividades inerentes à execução deste termo de fomento, inclusive quanto aos encargos sociais e trabalhistas decorrentes de seu objeto”.

Atualmente, apenas dois pacientes de Santos permanecem na Associação. O representante da Comissão de Saúde Mental do CMSS, Vlamir Mateus Leite, afirmou que a situação é realmente precária e que o local não tem condições de funcionar do jeito que está. No entanto, ele defendeu que a entidade seja notificada dos problemas e que a decisão sobre a renovação ou não do convênio seja adiada.

Por esta proposta a entidade teria um prazo para resolver todas as irregularidades. “Falta equipe técnica, faltam atividades terapêuticas, falta nutricionista, entre outros problemas. Mas esta é a única entidade que atende pacientes do sexo feminino”.

O coordenador municipal de Saúde Mental, Paulo Muniz, lembrou que das outras vezes em que a comunidade terapêutica foi alertada de problemas, os mesmos foram resolvidos posteriormente. “Após recebermos o primeiro relatório do COMAD apontando os problemas, nós mandamos questionamentos e eles responderam. No entanto, como chegaram hoje ainda não conseguimos analisar essas respostas”.

Presente na plenária, o vice-presidente da Associação Projeto Respeitar, Raulino Schmit, disse que a casa já vinha passando por reformas e que elas continuarão. Também se comprometeu a sanar todos as impropriedades no prazo de três meses. Por fim, discordou das denúncias de trabalho escravo.

“Não temos muros e nem cercas. Promovemos cursos em convênio com outras entidades. Tanto quanto o trabalho espiritual é importante a disciplina para esse público. A maioria dos adictos não tem mais disciplina. Temos que ser duros. Não só com afagos faremos com que voltem à normalidade”, afirmou, pontuando ainda que a casa não tem recursos e que depende dos convênios com o poder público.

De acordo com dados obtidos pelo site The Intercept via Lei de Acesso à Informação, nos últimos cinco anos, as chamadas Comunidades Terapêuticas – clínicas privadas normalmente ligadas à igrejas – receberam pelo menos R$ 250 milhões em recursos públicos só da esfera federal.

Algumas são acusadas de manter dependentes químicos em regime de trabalhos forçados e até de castigos físicos. Há relatos investigados pelo Ministério Público de superdosagem de medicações.

Santos

O valor do Termo de Fomento firmado com a Associação Projeto Respeitar, segundo o Portal da Transparência da Prefeitura de Santos, é de até R$ 120 mil. A entidade recebe R$ 1.000,00 por mês dos cofres municipais por paciente atendido. Apesar da parceria vigorar só até o dia 16 de janeiro de 2020, o CMSS deliberou no último dia 26 que apenas na plenária de março uma solução definitiva será tomada. Na ocasião os conselheiros votarão se o convênio pode ser ou não renovado com base em um novo relatório indicando se os problemas constatados foram ou não sanados pela entidade.

 

Apontamentos do COMAD sobre a Associação Respeitar

  • Correspondências passam por avaliação da coordenação

  • Acolhido que desistir do tratamento terá que aguardar 24 horas para ter a saída permitida

  • Não há espaço de contenção/ isolamento

  • Limpeza e comida são feitas pelos acolhidos, não havendo nenhum profissional contratado para isso

  • Não possui a quantidade de banheiros (um para cada seis residentes) exigida

  • Não há acessibilidade

  • Fiação do chuveiro exposta

  • Um dos alojamentos tem um buraco no teto

  • Colchões e janelas em mau estado de conservação

  • Todos os ventiladores dos alojamentos e espaços de convivência estão com fios cortados

  • Só há um extintor de incêndio e está exposto ao sol

  • Sala de informática não está em uso

  • Manutenção do espaço feita pelos acolhidos sem proteção individual

  • Não há visita íntima

  • Medicamentos são ministrados pelo coordenador e não por responsável técnico

  • Alta acontece quando finaliza o tempo previsto de acolhimento (7 meses) e não por indicação terapêutica

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